sábado, março 04, 2006

in memoriam




Agora, há lá duas pontes (uma quase ao lado da outra, progresso a dobrar), um anjo dourado, esguio e inerte, com os braços colados ao corpo, sobre uma construção de cimento que serve de templo no qual são lembradas as vítimas cujos nomes constam numa parede, creio que de vidro.
Vou à gaveta onde essa memória se guardou e pego em algumas palavras concretas que ouvi à exaustão: amendoeiras, asadouro, ponte, queda, pilar, noite, areia, batelão, sonar. Não sei que fazer com elas, ainda me queimam a pele, ainda me mostram um rio monstro, sem culpas sei, mas um rio acastanhadamente caudaloso, rugindo e sugando as vítimas como um gigante insaciado. Havia muitos anjos nos dias que se seguiram, anjos verdadeiros, mas demasiado humanos, demasiado impotentes. E as barragens não foram capazes de reter os corpos para que o luto se cumprisse, o vazio permanece vazio.
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