sábado, fevereiro 12, 2005

mimi


Ball of Twine, Roy Lichtenstein


Mimi saiu do autocarro, atravessou a rua distraidamente e seguiu pelo passeio quase sem transeuntes. Eram duas e meia de uma tarde cinzenta de Inverno, deveria estar no emprego, ao balcão da loja de peles cumprindo a rotina de há cinco anos, mas não estava. A amiga aceitou trocar com ela essa tarde e decidiu que faria o que quisesse regressando a casa à hora do costume sem dar a perceber que não tinha ido trabalhar. Tudo seria normal, faria o jantar, cuidaria dos filhos, do marido, do pai, adormeceria umas horas e voltaria a repetir-se no dia seguinte.
Se estivesse sol, teria ido ver os animais no zoo da Maia, o passe era de rede geral e vendo bem até gostava de andar de autocarro nessas horas em que as viagens são um suave embalo em bancos vazios, libertos de odores, de olhares cruzados e de contactos indesejados. Mas não estava, por isso cruzou a cidade à procura de um espaço amplo e fechado onde pudesse sentir-se confortável e protegida e sentisse mesmo assim a sensação de liberdade. Escolheu um museu. Não que percebesse de arte, não que fosse confirmar teorias ou desenvolver pontos de vista sobre técnicas, cores, tonalidades ou materiais, mas porque procurava paz, como um crente procura uma igreja.

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