leitura
Eric Kamp
Estação
Esperar ou vir esperar querer ou vir querer-te
vou perdendo a noção desta subtileza.
Aqui chegado até eu venho ver se me apareço
e o fato com que virei preocupa-me, pois chove miudinho
Muita vez vim esperar-te e não houve chegada
De outras, esperei-me eu e não apareci
embora bem procurado entre os mais que passavam.
Se algum de nós vier hoje é já bastante
como comboio e como subtileza
Que dê o nome e espere. Talvez apareça.
Mário Cesariny
"O que te escrevo não tem começo: é uma continuação. Das palavras deste canto que é meu e teu, evola-se um halo que transcende as frases..." Clarice Lispector
domingo, outubro 30, 2005
sexta-feira, outubro 28, 2005
quinta-feira, outubro 27, 2005
terça-feira, outubro 25, 2005
Competência 2
Volto ao meu diário como quem sabe que um bom desabafo ajuda a descomprimir e a ganhar forças. Há palavras que me ferem pelo que escondem e pelo que revelam. Ranking é uma delas. Não que me incomodem os estrangeirismos, é mesmo o significado novo que essa palavra vai ganhando numa evolução semântica silenciosa e inevitável face à realidade do ensino no país.
Ranking das escolas significa hoje em dia muito mais do que uma lista oficial que estabelece uma classificação de acordo com determinados critérios. Ranking significa a incapacidade de quem comanda este país desde há trinta e um anos. Ranking significa o desprezo pela realidade em função de um cenário que esconde a incompetência dos laboratórios de experiências educativas que sistematicamente criam pequenos monstros em tubos de ensaio e os vão remetendo para as escolas em despachos e despachos e despachos. Ranking significa a ignorância face às condições reais em que muitos professores e muitos alunos vivem e trabalham e que vão sendo salientadas de muitas e variadas maneiras por todos aqueles que se interessam pela educação. Ranking significa o artifício e a ilusão de sucesso apenas para alguns, mas que enganosamente se pretende estar acessível a todos.
Por isso, apetece-me dizer que andamos à deriva ainda neste país que não se desprendeu da Europa mas seguramente baralhou as coordenadas e, numa ânsia de apanhar o comboio do progresso, esqueceu o manual de instruções. E, para terminar, que tal a palavra sucesso, o que significará ela de facto? E a expressão Componente Não Lectiva? O que será isso?
Ranking das escolas significa hoje em dia muito mais do que uma lista oficial que estabelece uma classificação de acordo com determinados critérios. Ranking significa a incapacidade de quem comanda este país desde há trinta e um anos. Ranking significa o desprezo pela realidade em função de um cenário que esconde a incompetência dos laboratórios de experiências educativas que sistematicamente criam pequenos monstros em tubos de ensaio e os vão remetendo para as escolas em despachos e despachos e despachos. Ranking significa a ignorância face às condições reais em que muitos professores e muitos alunos vivem e trabalham e que vão sendo salientadas de muitas e variadas maneiras por todos aqueles que se interessam pela educação. Ranking significa o artifício e a ilusão de sucesso apenas para alguns, mas que enganosamente se pretende estar acessível a todos.
Por isso, apetece-me dizer que andamos à deriva ainda neste país que não se desprendeu da Europa mas seguramente baralhou as coordenadas e, numa ânsia de apanhar o comboio do progresso, esqueceu o manual de instruções. E, para terminar, que tal a palavra sucesso, o que significará ela de facto? E a expressão Componente Não Lectiva? O que será isso?
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segunda-feira, outubro 24, 2005
sexta-feira, outubro 21, 2005
quinta-feira, outubro 20, 2005
quarta-feira, outubro 19, 2005
ler e reler
Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar-me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.
Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.
Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.
Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.
Camões
segunda-feira, outubro 17, 2005
sarcofila
Todd Gipstein
Todd Gipstein
Ele esmagava uma folha que caíra da árvore sobre a mesa do bar. E como para lhe dar de presente alguma coisa, ele disse:
- Sabe o que é a sarcofila?
-Nunca ouvi esta palavra, respondeu.
-Sarcofila é a parte carnosa das plantas. Segure esta e sinta.
Estendeu-lhe a folha, Lóri tacteou-a com os dedos sensíveis e esmagou-lhe a sarcofila. Sorriu. Era lindo dizer e pegar em: sarcofila.
Clarice Lispector, Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres
- Sabe o que é a sarcofila?
-Nunca ouvi esta palavra, respondeu.
-Sarcofila é a parte carnosa das plantas. Segure esta e sinta.
Estendeu-lhe a folha, Lóri tacteou-a com os dedos sensíveis e esmagou-lhe a sarcofila. Sorriu. Era lindo dizer e pegar em: sarcofila.
Clarice Lispector, Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres
sábado, outubro 15, 2005
palavras
Georgia O Keeffe,Lake George,Autumn
Sabes que as palavras se alimentam de ti
como a criança do seio materno?
E que se fortalecem
(carne da tua carne, sangue do teu sangue)
à medida que as deixas pelo caminho
com o olhar sereno e protector
de quem vê um filho crescer?
E sabes que as palavras
te vestem com as cores das estações
e dançam à tua volta na leveza do ar
e, quando partes, elas te fazem permanecer
naquele lugar, com aquele aroma,
com aquele sabor?
E sabes, saberás com certeza,
que elas se unem em versos
para te celebrarem na passagem
das datas marcadas no calendário
do mundo perfeito, o mundo em ti?
Georgia O Keeffe,Lake George,Autumn
Sabes que as palavras se alimentam de ti
como a criança do seio materno?
E que se fortalecem
(carne da tua carne, sangue do teu sangue)
à medida que as deixas pelo caminho
com o olhar sereno e protector
de quem vê um filho crescer?
E sabes que as palavras
te vestem com as cores das estações
e dançam à tua volta na leveza do ar
e, quando partes, elas te fazem permanecer
naquele lugar, com aquele aroma,
com aquele sabor?
E sabes, saberás com certeza,
que elas se unem em versos
para te celebrarem na passagem
das datas marcadas no calendário
do mundo perfeito, o mundo em ti?
sexta-feira, outubro 14, 2005
quinta-feira, outubro 13, 2005
terça-feira, outubro 11, 2005
segunda-feira, outubro 10, 2005
domingo, outubro 09, 2005
sábado, outubro 08, 2005
sexta-feira, outubro 07, 2005
quinta-feira, outubro 06, 2005
o beijo
Rodin
Persigo-te pelos corredores vazios
E sinto a tua respiração sustida atrás das portas
Quando toco as paredes de mármore colorido
Sei que te transfiguras nas flores e nas árvores
E a natureza transpira a luz de todas as estações
Com a regularidade dos movimentos telúricos
Agarro o crepúsculo palpável dos aromas
E das linhas do teu corpo com a forma de um deus
O deus que adormece por momentos nos meus braços
...
laerce
Rodin
Persigo-te pelos corredores vazios
E sinto a tua respiração sustida atrás das portas
Quando toco as paredes de mármore colorido
Sei que te transfiguras nas flores e nas árvores
E a natureza transpira a luz de todas as estações
Com a regularidade dos movimentos telúricos
Agarro o crepúsculo palpável dos aromas
E das linhas do teu corpo com a forma de um deus
O deus que adormece por momentos nos meus braços
...
laerce
quarta-feira, outubro 05, 2005
antes e depois de 5 de outubro de 1910
Mitch Ostapchuk
Irás ao paço. Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou mais ser que a outra gente
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto
Irás ao paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência
Este país te mata lentamente
Sophia de Mello Breyner Andresen
Mitch Ostapchuk
Irás ao paço. Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou mais ser que a outra gente
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto
Irás ao paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência
Este país te mata lentamente
Sophia de Mello Breyner Andresen
terça-feira, outubro 04, 2005
segunda-feira, outubro 03, 2005
domingo, outubro 02, 2005
velado
Brian Gordon Green
Não quero que o meu amor te pese nas mãos
como malas de viagem no cais de embarque.
Nem quero que te fira os olhos com lágrimas
no momento do adeus abafado num soluço.
Não quero ligado a nós nenhum lugar,
nenhuma música, nenhum momento do dia.
Quero mesmo ser o sussurro do riacho,
a água fresca ou a brisa que te afaga o rosto.
Quero que o meu amor seja uma luz
diante dos teus passos, de todos os teus passos.
Quero que sorrias enquanto dormes
Enquanto teço a teia em que te prendo.
...
laerce
Brian Gordon Green
Não quero que o meu amor te pese nas mãos
como malas de viagem no cais de embarque.
Nem quero que te fira os olhos com lágrimas
no momento do adeus abafado num soluço.
Não quero ligado a nós nenhum lugar,
nenhuma música, nenhum momento do dia.
Quero mesmo ser o sussurro do riacho,
a água fresca ou a brisa que te afaga o rosto.
Quero que o meu amor seja uma luz
diante dos teus passos, de todos os teus passos.
Quero que sorrias enquanto dormes
Enquanto teço a teia em que te prendo.
...
laerce